HEBRON Atualidades 52 - Julho-Agosto/2011

18 // Hebron Atualidades Hebron Atualidades // 19 S uicídio sempre foi um tema delicado. Classica- mente, era considerado uma atitude covarde de uma pessoa fraca que diante dos problemas da vida escolhia fugir de forma drástica em vez de enfrentá- -los. A proximidade de alguém que decidia dar cabo à vida deixava todos perplexos e perguntando se nada poderiam ter feito para evitar um gesto tão treslou- cado. Hoje, a medicina entende o suicídio dentro de um contexto absolutamente diverso. Sabemos que o cérebro funciona à custa de uma série de substâncias químicas, que são liberadas para integrar os circuitos de neurônios, chamadas neurotransmissores e que têm grande importância no ato final do suicídio. Suicídio A palavra suicídio ( sui = si mesmo; caedes = ação de matar) foi utilizada pela primeira vez pelo filósofo francês e abate Desfontaines, em 1737, e significa mor- te intencional auto-inflingida, isto é, quando a pessoa, por desejo de escapar de uma situação de sofrimento intenso, decide tirar sua própria vida. De acordo com dados atuais da Organização Mun- dial de Saúde (OMS), cerca de três mil pessoas por dia cometem suicídio no mundo, o que significa que a cada 30 segundos uma pessoa se mata. Estima-se que para cada pessoa que consegue se suicidar, 20 ou mais ten- tam sem sucesso e que a maioria dos mais de 1,1 milhão de suicídios a cada ano poderia ser prevista e evitada. O cérebro do suicida Os neurotransmissores são substâncias que me- deiam todo e qualquer processo no nosso cérebro. Entre eles encontram-se a serotonina, responsável pelas atitudes ligadas ao impulso, a noradrenalina ou epinefrina, responsável pelo interesse que as coisas despertam no indivíduo, mas que se encontra em concentrações reduzidas nas pessoas deprimidas, e a dopamina, envolvida no mecanismo de tomada de // Por Vivianne Santos CAPA // Suicídio: uma estatística alarmante Dados atuais da OMS apontam que cerca de três mil pessoas por dia cometem suicídio no mundo, o que significa que a cada 30 segundos uma pessoa se mata decisões. Alteração nesses neurotransmissores provoca quadros de ansiedade, irritabilidade, humor instável e emoções comprometidas. No caso do suicídio, a grande alteração ocorre por conta da produção de serotonina. Em um cérebro normal, os neurotransmissores serotonina e noradrenalina são jogados na sinap- se, espaço existente entre dois neurônios. Se há mensagem, eles se encaixam no neurônio seguinte, a mensagem prossegue seu caminho e o neuro- transmissor que sobra é reaproveitado. A bomba de recaptação mantém a estabilidade no cérebro. Quando estamos bem e felizes, é sinal de que os neurônios estão funcionando convenientemente. Esse equilíbrio faz com que tenhamos vontade de fazer as coisas. Quando, por algum motivo externo ou bio- lógico (na depressão pesam fatores genéticos), a produção de neurotransmissores é reduzida e os receptores não recebem a informação, a pessoa fica desanimada, de mau humor, deprimida, não consegue trabalhar, estudar nem realizar qualquer outra atividade com prazer. Tudo isso acontece independentemente da von- tade dela . Por mais que queira aceitar um convite, não consegue. O neurônio, ávido por informação, começa a aumentar o número de receptores em sua membrana, mas não existem neurotransmissores, como a serotonina ou a noradrenalina. Nesse estágio, quando a pessoa procura atendimento médico, são prescritas substâncias antidepressivas que vão bloquear a recaptação e aumentar gradativamente os níveis de neurotransmissores. O suicídio explicado pela psicanálise Qualquer pessoa pode cometer suicídio. De acordo com a psicanalista Ana Lúcia Bastos Falcão, o agente desta passagem ao ato, o suicídio, não possui uma es- trutura específica, uma característica. “Há, no entanto, // CAPA uma maior propensão ao suicídio em estados melancó- licos e de perdas, nas quais não há simbolização, ou em psicóticos. Nos melancólicos, o vazio sentido pode ser provocado não por um motivo atual, ligado à época e relacionado a um objeto recente, mas, anteriormente, a uma falha no imaginário, a uma falta do olhar do Outro materno. O olhar é importante para a constituição da criança, e a falha dele compromete a estrutura do ser humano. A partir dessa falha, a visão no espelho da pessoa fica precária. Pode ocorrer estados de tristeza radical, sem nenhuma visão de futuro, e também de imaginação da ausência de solução de conflitos, de temor de um destino, sem possibilidade de viver o luto. Esses são alguns exemplos de momentos que podem levar alguém a um ato como a extinção da própria vida, ato que exclui qualquer mediação pela palavra, por um diálogo”. “Nos psicóticos é comum o suicídio provocado, muitas vezes, por comandos e ordens ouvidas por eles, visões etc. O psicótico não sente essa ordem ou visões como provenientes de dentro deles, têm cer- teza que elas vêm de fora, do exterior. Embora esse exterior seja constituído pelos conteúdos internos do psicótico, é impossível a ele, devido à precariedade da sua estrutura, perceber que essas vozes ou visões vêm de dentro, então, ele não vê saída e decide “obedecer” a essas alucinações e delírios. Geralmente, ele não tem com quem conversar sobre esse assunto, a maioria das pessoas não suporta escutá-los. Então, para cumprir com as “solicitações” desses fenômenos da ordem do imaginário, eles se suicidam. Muitas vezes não há ninguém que possa se interpor para um diálogo com o psicótico sobre esses fenômenos e, outras vezes, ele próprio proíbe ou não permite que ninguém entre nessa conversa. Submete-se como um escravo a esses mandos”, explica Ana. Probabilidades Através da observação dos casos de suicídios, pode-se constatar que há certos fatores que estão relacionados a uma maior ou menor probabilidade de cometer o suicídio. Por exemplo, as mulheres tentam o suicídio quatro vezes mais que os homens, mas os homens o cometem (isto é, morrem devido à tentativa) três vezes mais do que as mulheres. Isso se explica pelo fato de os homens utilizarem métodos mais agressivos e potencialmente letais nas tentativas, tais como armas de fogo ou enforcamento, ao passo que as mulheres tentam suicídio com métodos menos agressivos e, assim, com maior chance de serem ineficazes, como tomar remédios ou venenos. A idade também está relacionada às taxas de suicí- dio, sendo que a maioria dos suicídios ocorre na faixa dos 15 aos 44 anos. Doenças físicas, tais como câncer, epilepsia e AIDS ou doenças mentais, como alcoolismo, drogas, depressão e esquizofrenia, são fatores relacio- nados a taxas mais altas de suicídio. Além disso, uma pessoa que já tentou o suicídio anteriormente temmaior risco de cometê-lo. Causas Uma série de fatores estão associados com o risco de suicídio, incluindo doença mental, drogas, bem como fatores sócio-econômicos. Para boa parte dos especialis- tas, a genética tem um efeito sobre o risco de suicídio, atuando através da hereditariedade da doença mental. Os transtornos mentais são frequentemente presen- tes durante o momento do suicídio, com estimativas de 87% para 98%. Transtornos de humor estão presentes em 30%, abuso de substâncias em 18%, esquizofrenia em 14%, transtornos de personalidade em 13% dos suicídios. Estipula-se que cerca de 5% de pessoas com esquizofrenia morrem de suicídio. O abuso de substâncias é a segunda causa mais comum de suicídio depois dos transtornos de humor. Tanto o abuso crônico de substâncias, bem como o abuso de substâncias aguda está associada a um risco aumentado de suicídio. Isso é atribuído aos efeitos intoxicantes e desinibidor de muitas substâncias psico- ativas, quando combinado com o sofrimento pessoal, como o luto, o risco de suicídio é muito maior. Mais de 50% dos suicídios estão relacionados ao álcool ou drogas. Até 25% dos toxicodependentes e alcoólicos cometem suicídio. Em adolescentes, o número é maior com álcool ou abuso de drogas, que desempenha um papel em até 70% dos suicídios. Um estudo encontrou maior frequência de suicídio entre pessoas com famílias desestruturadas e após rom- pimentos de relacionamentos amorosos entre jovens. Entre adultos, separações e problemas financeiros são fatores de risco.

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